Oscar 2021 | Como ‘Promising Young Woman’ cria uma atmosfera ambígua entre um assunto tão sério
30 Março, 2021Promising Young Woman ou simplesmente Bela Vingança aqui no Brasil, é um filme produzido pela Margot Robbie, e, dirigido pela atriz, roteirista e diretora britânica Emerald Fennell.
Emerald não é uma figura estranha em Hollywood, além da participação de alguns filmes dramáticos de época, também foi uma das roteiristas da série de sucesso, Killing Eve, e interpretou a Camilla Bowles (amante) do Príncipe Charles, na quarta temporada de The Crown.
O filme apresenta um olhar cru, vasto e cirúrgico de comportamentos abusivos e misóginos de muitos homens, reproduzidos por nossa sociedade até os dias de hoje. Onde as consequência desses comportamentos podem ser fatais, levando a traumas para o resto da vida, tanto para a vítima, quanto para as pessoas ao seu redor. Há quem diga que o filme tenta passar uma representatividade feminina com a personagem central. A premissa de sentir-se no comando da situação, enfrentando uma porrada de homens maus após conduzi-los a uma emboscada final, coloca algumas vezes em risco a própria vida da personagem. O filme trata o assunto de forma ambígua, e ao mesmo tempo que é necessário, acaba se tornando um ato também irresponsável.
ATENÇÃO: ESTA CRÍTICA PODE CONTER SPOILERS PARA QUEM NÃO ASSISTIU O FILME AINDA
A ambientação do filme, está ligada diretamente a locais hostis para mulheres, adultas ou jovens. Tais como boates, faculdades e local de trabalho. Cassie começa a sua jornada num bar, visivelmente bêbada e “vulnerável”, e a partir daí começa a mostrar uma conversa entre um grupo de homens ao lado ao vê-la naquela situação. Comentários nocivos, nojentos e inescrupulosos, podiam facilmente ser vistos em algum fórum de incel da internet ou de sites pornográficos. E a exibição do comportamento tóxico do grupo causam completa repulsa a quem está assistindo de imediato. É simplesmente desconfortável ouvir todos aqueles gestos e palavras.
Logo após o show de horrores verbalizado entre eles, um dos homens toma atitude e vai até Cassie (Carey Mulligan), e oferece ajuda. Aparentemente tudo ocorreu bem e consensual até estarem no táxi, onde ele sugere que eles continuem bebendo em seu apartamento. Cassie aceita o convite e entre algumas conversas, acontece o primeiro ato sexual do filme, onde ela pede repetidas vezes pede para que ele parasse de tocá-la, e ele não liga para a situação. Para surpresa do público ou não, ela nunca esteve bêbada ali. E assim começa a história do filme. Ela é uma mulher em busca de vingança aos homens que não tem limites e respeito com as mulheres, quanto ao sexo.
Cassie é uma mulher completando os 30 anos; uma pessoa de poucos amigos, sem namorado, e mesmo independente, escolhe continuar morando com os pais. Ela também abandonou a faculdade de medicina, e todos seus sonhos desandaram após um evento traumático ocorrido na mesma. Somos apresentados também a Nina, e a sua triste história a qual atormenta a vida de Cassie por vários anos. Ao longo da trama, Cassie tenta estabelecer uma vida normal ao se reencontrar com um velho amigo de turma, onde se apaixonam e ela precisa escolher entre a vida antissocial, ou apenas entender que pode ser feliz ao lado de alguém com uma vida mais “normal”.
Como todo filme, Promising Young Woman não fica de fora de receber críticas negativas de vítimas reais, as quais passaram por agressões sexuais, abusos e outros crimes. O filme tem a intenção de tratar de assuntos sérios como a cultura do estupro, assédio sexual e o machismo, mas também vai beirando a irresponsabilidade ao relatar todos eles. Ele é cheio de irreverência e com um toque de porn revenge. Um thriller psicológico disfarçado (ou não) de sátira, que mesmo sem sangue e vísceras voando pela tela do espectador, cria uma atmosfera muitas vezes constrangedora, perturbada e caótica.
O fato de ser levado pro lado da sátira, é que ele pode ser incompreendido. Isso polariza opiniões acerca de como o cinema pode estabelecer um limite para lidar e retratar assuntos sensíveis, sem que isso desperte traumas de outras pessoas, além do mais quando inseridos num contexto de alívio cômico, e com um final radicalizado. O roteiro e corte final não tem nenhuma responsabilidade social ou de contextualizar a vivência de todas as mulheres, apesar da diretora estar ciente disso e inserir momentos em que vemos como muitos dos casos passam batidos pela sociedade; mostrado na cena onde a diretora da universidade descredibiliza o acontecido, ou também a ex colega ao não demonstra solidariedade à vítima.
A realidade é que todos parecem seguir em frente e isso torna a situação mais difícil para a protagonista. O filme é enxuto e focado apenas no ato brutal da persona criada pela Cassie para lidar com seus problemas e sofrimento. Cassandra é uma agente da vingança, como a Beatrix Kiddo em Kill Bill, só que diferente da personagem do Quentin Tarantino, ela não responde por um ato totalmente ligado a ela, é a busca vingança por um crime cometido contra a vida da sua melhor amiga, que também teve seus sonhos interrompidos.
O fato é que estamos numa década onde precisamos gerar discussões sobre esses tópicos, principalmente no meio do cinema onde ocorrem diversas denúncias acerca do abuso e assédio contra as atrizes e também sobre as festas sem limites que acontecem dentro das universidades. Mas, de alguma forma, o filme pode banalizar o pensamento de várias vítimas, sem contar os despertar de gatilhos emocionais pelas situações de embrulhar o estômago.
Carey Mulligan nos dá um show de atuação, isso não resta dúvidas. Boa parte do filme é carregado nas costas pela sua presença de tela, é frenético, e seu carisma se sustenta até o final. Tudo isso em meio uma trilha sonora com diversos temas pop conhecidos, como Britney Spears e Paris Hilton, mas com um leve toque de terror na sonoridade. Além disso o filme conta com alguns nomes já conhecidos como Alison Brie, Adam Brody, Jennifer Coolidge e Laverne Cox. O filme vai te dar breve momentos de ansiedade e provavelmente sairá frustrado, com várias quebras de expectativas, mas que ainda vale a pena ser assistido.
Sou cinéfila e meu filme favorito é indie e pouco conhecido, ele se chama Barbie Fairytopia.